A mudança para o mercado liberalizado da electricidade é um tema que já abordamos aqui várias vezes. Há um ano, davamos conta das primeiras incursões. Para nós que temos o bi-horário, as ofertas tardaram a ser lançadas, e quando chegaram, deixaram muito a desejar.
Mas, por diversas ordens de razão, estou agora envolvido em vários processos de mudança. Há muitos aspectos que se têm revelado verdadeiramente frustrantes na averiguação do melhor comercializador, como as dezenas de minutos perdidos para que me atendam uma chamada. Felizmente, neste aspecto há o alta-voz, sendo assim possível paralelizar mais uma tarefa, embora com os custos de comunicação, que é preciso ter algum cuidado, porque são quase todos iniciados por 808…
Para se perceber o que vamos analisar de seguida, é necessário entender que a ERSE refere que ”associada à liberalização e à construção do mercado interno de electricidade está um esperado aumento da concorrência, com reflexos ao nível dos preços e da melhoria da qualidade de serviço, a que deverá corresponder uma maior satisfação dos consumidores de energia eléctrica”. Todavia, o Decreto-Lei nº75/2012 refere no seu artigo 4º que “compete à ERSE fixar as tarifas transitórias de venda de eletricidade em BTN, as quais são determinadas pela soma das tarifas de energia, de acesso às redes e de comercialização, acrescidas de um montante resultante da aplicação de um fator de agravamento, o qual visa induzir a adesão gradual às formas de contratação oferecidas no mercado”.
Sucede do parágrafo anterior que quem tenha mudado, ou venha a mudar, para o mercado liberalizado, não deveria ser penalizado por esse factor de agravamento. Não parece ser isso que está a acontecer!
No caso da GALP, promete-se um desconto de 2%. Todavia, no ponto a.1)5. da página de FAQs, podemos confirmar que “os descontos incluídos nos planos Galp On são calculados face à tarifa regulada (ou transitória) em vigor e são aplicáveis durante o tempo de vigência do contrato”.
Na Endesa, nesta página podemos observar que tem direito a um desconto de 5% no consumo de electricidade durante um ano. Nas tarifas no fundo dessa página encontramos todavia uma referência clara à penalização que os clientes sofrerão do factor de agravamento: “As variações que se produzam nos elementos regulados (tarifas de acesso e outros) aplicáveis, assim como os novos que possam surgir, transferir-se-ão para o cliente, tanto no caso de acréscimo como de decréscimo”.
Na EDP, o cenário não é mais animador. No tarifário casa pode-se ler que existe um desconto de 2% no consumo, mas logo abaixo lê-se que “nas opções com pagamento por multibanco, simples e tri-horária, o seu tarifário será igual ao do mercado regulado”. Nas Condições Gerais do Contrato de fornecimento de energia que “a EDP Comercial poderá livremente introduzir, nos termos da Cláusula 12.2, alterações no Preço a pagar pelo Cliente, incluindo nas seguintes situações: a. no caso de alteração às tarifas publicadas pela Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (“ERSE”), quer seja ao seu valor ou à própria estrutura tarifária, nomeadamente pela sua recomposição ou introdução de novos componentes”. Neste último aspecto, não parece que a referência seja ao factor de agravamento, mas a referência anterior ao mercado regulado levanta dúvidas.
Na Iberdrola promete-se 10% de desconto e em nenhum local parece existir uma indexação ao mercado regulado. Todavia, nas Condições Gerais, no ponto 4.2, refere-se que “ao preço acresce a tarifa de acesso que dado o seu carácter regulado se encontre em vigor, sendo o seu montante periodicamente revisto e publicado pela ERSE (www.erse.pt)”. No ponto 4.4 refere-se ainda que “a IBERDROLA poderá livremente introduzir alterações no preço a pagar pelo CLIENTE, reflectindo-se essas alterações de forma automática no preço contratado, nas seguintes situações: a)No caso de alteração pela ERSE da tarifa de acesso ou qualquer outro termo regulado aplicável ao CLIENTE no mercado livre;”.
Da observação de algumas tarifas apresentadas pelos comercializadores, e sobretudo das letras pequeninas, resulta claro que, e a menos que alguma coisa seja feita, muitos dos consumidores do mercado liberalizado arriscam-se a levar com aumentos que lhes não deviam ser imputados.