Visão geral do projecto-piloto Inovgrid Fonte: EDP Distribuição
Quando perguntei se contadores inteligentes de eletricidade passariam a ser o espião da companhia em nossa casa, aproveitei o relatório da ERSE de 2012 sobre a implementação de contadores inteligentes para tecer alguns comentários.
A questão que não coloquei foi sobre quem defendeu o ponto de vista do consumidor no relatório. O relatório da ERSE refere que houve uma/alguma reunião com associações e que compareceram a DECO e a UGC:
Em Portugal as associações que representaram os consumidores no relatório da ERSE não parecem alertadas para o tema da liberdade, da segurança ou do equilíbrio entre um cliente e o fornecedor. O relatório da ERSE refere que houve comentários, mas não refere quaisquer preocupações das associações de consumidores com:
- a perda de liberdade do consumidor e/ou com a alteração de balanço de poder entre estes e as empresas que prestam os serviços;
- a segurança dos dados do cliente; ou
- a inspeção dos dados acessíveis ao fornecedor por este poder aceder remotamente o contador inteligente.
Os projetos piloto disponíveis no relatório apontam ambos para o acesso aos dados diretamente pelo operador por uma porta de acesso da rede externa, o que levanta ainda mais questões. Esta porta na rede externa ficará disponível fora dos controlos de segurança típicos da rede doméstica e a informação ficaria disponível ao prestador de serviços, referidos como Operador de Rede de Distribuição (ORD) no relatório, sem qualquer controlo ou possibilidade de inspeção pelo cliente acerca do que é entregue.
A primeira vantagem no uso dos contadores inteligentes referida pelos ORD segundo este relatório é o “contributo para um aumento da eficiência energética, por mudança de comportamento dos consumidores, incluindo a transferência de consumos das horas de ponta/cheia para vazio e redução de consumos.”. Esta preocupação dos ORD não tem qualquer suporte na realidade atual do mercado energético. A atual da oferta de mercado apresenta hoje uma vantagem reduzida ao consumidor no uso de tarifas bi-horárias e os ORD do mercado liberalizado relegaram para segundo plano a oferta deste serviço em bi ou tri horário.
A segunda vantagem referida no relatório é a “Criação de uma plataforma para novos serviços e produtos”. Bem… Eu queria mesmo era eletricidade. Isto da “plataforma para novos serviços e produtos” parece-me novilingua para “comprem-me coisas que anteriormente teriam direito, mas que eu decidi produtizar” (mais novinlingua).
Estes “novos serviços e produtos” criam um problema no mercado da eletricidade onde ele não existia. Já conhecemos o tipo de problema a que me estou a referir porque já o temos na Internet na questão da neutralidade da rede na prestação de serviços. A questão levanta-se quando um prestador passa a ter a capacidade de privilegiar o transporte de um serviço em detrimento do outro. Seja com que racional for, e sobre que capa for, a diferenciação por serviço com isso deteriora um tipo de serviço e privilegia outro.
O problema da neutralidade existe quando o operador do meio de transporte tem interesse num dos serviços prestados sobre esse meio.
Se tivermos um serviço A do operador 1 e o serviço B de um prestador de serviços sem meio de transporte, ambos em concorrência no mesmo meio de transporte do operador 1, ambos os serviços em cima do mesmo meio e sem separação, quem nos garante que o operador 1 não altera o comportamento do meio de transporte em beneficio do serviço que ele próprio vende?
A terceira vantagem referida no relatório da ERSE para os ORD é a “Possibilidade de o ORD efectuar operações remotamente, por exemplo, parametrização, corte ou religação”. Os consumidores do Reino Unido já conhecem esta vantagem que o operador passou a ter sobre eles.
Pessoalmente, prefiro quando há vantagens para os intervenientes todos de um negócio. Prefiro em concreto quando no negócio o consumidor não é a mercadoria.