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Municípios onde o ordenado de “Profissionais altamente qualificados” é maior

Hoje de manhã, no feed do LinkedIn, foi-me apresentado um artigo que revelava que a Fundação Francisco Manuel dos Santos havia revelado há três semanas quais os Municípios do País onde o ordenado médio mensal é maior, ou era maior em 2021. Em primeiro lugar, Castro Verde (a explicação estará na Somincor) e em terceiro lugar Oeiras, o que também se percebe. Mas, Alcochete em segundo?

Porquê Alcochete? Era um bom desafio perceber porquê? Primeiro pensei que pudesse ser derivado da Câmara Municipal, que realmente emprega quase 10% da população ativa do concelho. Mas não podia explicar, embora a população ativa do concelho fosse inferior a 10 000 pessoas.

Em conversa com o Álvaro, que conhece muito melhor Alcochete que eu, percebemos que haveria muito provavelmente um outlier que explicaria isso: jogadores de futebol. Mas como prová-lo?

Felizmente, há mais métricas que podem ser analisadas. E uma delas é a referente à dos ordenados médios dos “Profissionais altamente qualificados”, por concelho. Nesse sentido, a partir dos dados da Pordata de 2019, compilei a lista dos cinco municípios onde os “Profissionais altamente qualificados” mais ganham neste País, em média:

Não é preciso puxar muito pela cabeça para perceber porque é que afinal Alcochete é o segundo Município do País onde o ordenado médio mensal é maior. E já agora, no gráfico anterior, o Seixal também se percebe bem, embora como tenha uma população ativa bem maior, passa naturalmente despercebido a nível da média nacional.

Independemente de tudo o resto associado, há aqui uma conclusão importante: tem que se ter sempre em conta que a média é em termos estatísticos muito problemática. Já o havíamos referido aqui neste artigo, mas deixo aqui a imagem desse artigo novamente, porque me parece que exemplifica bem o que se passa em Alcochete:

Trabalhar menos?

Por todo o lado somos inundados de suposto conhecimento, que nos vai moldando aqui e acolá na nossa forma de ser. Mas há que separar o trigo do joio, e isso parece uma guerra perdida nos dias de hoje! Para mim, começa a ser penoso ler a maioria da “informação” que me chega, tal é a quantidade de “fake-news” que consigo apanhar… Uma das mais aberrantes dos últimos dias aconteceu com a leitura dum artigo da BBC. O título provocante é qualquer coisa do género: argumentos convincentes para trabalhar muito menos.

De tanta confusão espalhada no artigo, com muito nonsense misturado, há uma em que até se verifica que é o próprio autor que fica confuso:

  • Even on a global level, there is no clear correlation between a country’s productivity and average working hours. With a 38.6-hour work week, for example, the average US employee works 4.6 hours a week longer than a Norwegian. But by GDP, Norway’s workers contribute the equivalent of $78.70 per hour – compared to the US’s $69.60.

A lógica da batata é a de que os Americanos trabalham mais que os Norugueses, mas que em termos do PIB o contributo dos Noruegueses é maior? Ou seja, e para reforçar a suposta revelação do artigo, trabalhando menos que os Americanos, os Noruegueses produzem mais! Esta lógica da batata é muito comum por aí, e particularmente comum quando se fala de produtividade. E o autor obviamente não conhece a máxima de que correlation doesn’t prove causation

O problema do autor deste artigo, e de muita gente que manda bitaites neste domínio, é que não se preocupa minimamente em perceber como é que, neste caso, os Noruegueses conseguem tal milagre? Mas, se olharem com atenção para o gráfico abaixo, rapidamente percebem que cerca de 60% das exportações lá do sítio, em 2009, vinha dos combustíveis fósseis. Assim, também os Portugueses seriam provavelmente produtivos:

Exportações da Noruega em 2009

Acontece que o petróleo e o gás natural estão a acabar no Mar do Norte. E de então para cá, a percentagem tem vindo obviamente a baixar. E o que está a acontecer ao PIB da Noruega, e à produtividade num País onde se trabalha menos? O resultado está no gráfico seguinte, onde se verifica que o rombo é ainda maior que em Portugal (gráfico obtido via este link).

PIB Noruega vs Portugal

É natural que eles estejam por isso alarmados. E as recentes eleições foram um quanto espectaculares, com a esquerda tradicional a prometer um aumento de impostos, a ganhar as eleições, mas a não resistir a uma manutenção de uma espécie de geringonça ao contrário lá do sítio. Enfim, a menos que descubram mais uns poços, e os aproveitem, os maiores produtores de petróleo e gás natural da Europa deixarão de ser um exemplo…

Loucuras e falácias da Medicina

Este é mais um artigo sobre marteladas. É novamente na área da Medicina, área onde o martelar parece ter muito sucesso…

A confirmar isso está um documento, na verdade um livro, com um título sugestivo: “Follies and Fallacies in Medicine“. O primeiro capítulo é dedicado ao efeito placebo. O autor, entretanto falecido, passa depois a um enorme conjunto de falácias. O livro tem ainda outro capítulo dedicado às medicinas alternativas, donde se destaca a homeopatia e a acupunctura, entre outros.

O livro dá uma boa leitura, e ajuda-nos a compreender o conjunto extenso de “remédios” que aparecem para as nossas muitas maleitas. O que nos permite estar melhor preparados, sempre que ouvimos as soluções miraculosas que pululam por aí…

Média, mediana e moda

A média, mediana e moda são conceitos estatísticos que a grande maioria de nós conhece. Mas, muitas vezes, não dominamos todas as suas particularidades…

Na nossa área das marteladas, já referimos vários exemplos de como a matemática pode ser distorcida para passar determinadas mensagens. E a estatística é uma ferramenta essencial nesse processo.

De todas as formas que já vi explicada a diferença entre média, mediana e moda, a que está abaixo é para mim claramente a mais eloquente! É divulgada na página de Rick Ord, professor da Universidade da California. Neste caso, é possível brincar com o conceito da desigualdade. E reparem como há um valor ao jeito das várias interpretações!

Mas, este é apenas um exemplo, porque noutros cenários, a realidade está pronta a ser distorcida por quem nos dá as estatísticas…

Média, Mediana e Moda

Média, Mediana e Moda

Estatísticas milionárias regurgitadas

Algumas vezes, até as crianças fazem melhor (retirado daqui)

Algumas vezes, até as crianças fazem melhor (retirado daqui)

Há várias semanas li um artigo onde se reclamava que num estudo de 2015 da Camelot (equivalente aos Jogos Santa Casa no Reino Unido) se tinha chegado à conclusão de que 44% dos milionários ficavam na falência passados 5 anos.

O número era suficientemente interessante para merecer uma investigação melhor! Como era um estudo recente, não deveria ter dificuldades em chegar aos dados originais. Em quase dois meses, voltei a descobrir como a informação mastigada e regurgitada vai alimentando a Internet! E como foi um dos maiores desafios de encontro de dados aqui no Poupar Melhor, comecei a alimentar um “diário” do desafio a que ia dedicando um minuto aqui e outro acolá…

O site do Statistic Brainer tem uma página com várias estatísticas sobre a lotaria. Tem no fundo da página uma referência para uma “verificação estatística” que diz que a investigação é de 2016/01/12 e que a fonte é a própria “Camelot Group PLC”. Outra página que aparece frequentemente associada a esta temática é este artigo de Fevereiro de 2015 do The Richest, onde se percebe que estamos a falar dos mesmos valores… O artigo refere que o estudo da Camelot é do ano anterior, pelo que de 2014.

Passei então a pesquisar os sites da Camelot, e de várias instituições associadas ao jogo em Inglaterra. Pesquisei no Google, limitando os resultados por períodos de tempo cada vez mais antigos. Foi assim que descobri um estudo da Camelot de 2012,  por altura do registo de 3000 milionários na lotaria inglesa. Uma leitura atenta do documento revelou que não havia qualquer referência a milionários falidos.

Depois de mais tempo perdido, comecei a perder a esperança. Até que noutro dia me lembrei de juntar o Arquivo da Internet à equação. Um dos primeiros saltos foi à página do Statistic Brainer, onde descobri que a versão mais antiga disponível, de 2012, refere outro estudo da Camelot, só que agora de 2006! Pouco tempo depois identificava um estudo de 2006, da Universidade de Nottingham, sobre os efeitos da lotaria na felicidade, satisfação e humor dos vencedores. Infelizmente, nenhuma referência a 44%…

Continuei a recuar no tempo, à procura da mensagem mais antiga envolvendo os 44%. Até que seguindo links, fui ter a uma mensagem num arquivo de listas da Internet,  onde se falava nos 44%, mas numa perspectiva diferente. Todavia, a leitura das restantes estatísticas confirmava que se trataria do mesmo estudo!

O estudo em causa, Winning The National Lottery Is Good For You!, foi realizado em 1999, e publicado em Novembro desse ano. O estudo, na verdade realizado pela Ipsos MORI, refere todavia o seguinte:

On average, the winners have so far spent 44% of their winnings

Ou seja, 44% não foram à falência, mas sim, em média, cada um dos entrevistados tinha gasto 44% daquilo que tinha ganho. E, olhando para a ficha técnica do inquérito, foram 249 os entrevistados, entre os que tinham ganho pelo menos 50 000 £, dos quais 111 com um prémio superior a um milhão de libras. E, note-se ainda que não foram 5 anos para cada milionário, mas nos anos de 1994 a 1999, pelo que presume-se que em média os premiados teriam-no sido em média nos últimos dois anos e meio…

Enfim, este parece ser mais um exemplo claro do lixo informativo que permanece em grande parte da Internet. Pode ser que a minha análise esteja errada, e por isso se o leitor encontrar mais alguma peça deste puzzle, digam-no! Mas o que ele revela é que o bom hábito de linkar para a informação original se vai perdendo quase que definitivamente nesta rede global. E, como no jogo do telefone estragado, o que sai no final quase nunca é fiel ao original!

Martelar a Ciência

A etiqueta sobre marteladas é uma das minhas preferidas no Poupar Melhor. Aplicado à poupança, isso quer dizer que é importante sabermos como poupar, mas é igualmente importante saber aquelas coisas não nao servem para poupar, ou são mesmo uma fraude.

Ao ler este artigo há uns dias, fiquei a perceber que a fraude grassa muito mais pela Ciência do que aquilo que já pensava, e que aquilo que nos impingem todos os dias pode estar de tal forma inquinada, que o melhor seria mesmo não pensar nisso. Mas, como gosto muito do método científico, estou a devorar várias vertentes referenciadas no artigo, antes de as “papaguear”. Porque sim, esta pode também ser conotada com as grandes teorias da conspiração…

O artigo que referenciei acima dá um exemplo muito interessante, baseado no teorema de Bayes. Se não leram o artigo tentem ao menos acertar no paradoxo seguinte:

Suponha que está preocupado com a possibilidade de ter uma doença rara. Decide fazer um teste, e suponha que o método de teste dessa doença é correcto em 99% dos casos. Por outras palavras, se tiver a doença, o teste di-lo com 99% de certeza, e se não tiver a doença, o teste diz que não tem a doença com uma igual certeza de 99%. Suponha ainda que a doença é na verdade bastante rara, ocorrendo de forma aleatória na população em geral apenas em uma de cada 10 000 pessoas.

Chegou o momento da verdade: você abre os resultados e eles são positivos. Quais são as probabilidades de ter realmente a doença?

  • 99%
  • 98%
  • 50%
  • menos de 1%

Para ficar mais descansado, veja a resposta aqui.